Educar na era dos excessos
Por Regina Delduque
Vivemos uma época em que tudo tem que ser rápido. Não somente as crianças estão agitadas e desconcentradas, mas todos nós. Segundo Leonardo Posternak, pediatra e diretor do Instituto da Família, o imediatismo se observa em todos os setores da vida adulta: a satisfação das necessidades, o êxito, a compra de bens, etc. Ninguém tem tempo para nada, muito menos para pensar. E tudo isso se transfere para as crianças: elas têm que sentar, ficar em pé, andar e tirar a fralda rapidamente; e na escola tem que aprender rápido para não ficar para trás.
O que deveria ser respeitado é o tempo da criança, ou seja, o tempo de ser criança. Tempo de brincar e momentos de ócio, que é quando a criança pensa e elabora os sentimentos vitais, bons ou ruins, as fantasias e o cotidiano. Os brinquedos eletrônicos, entretanto, não permitem nenhuma dessas elaborações.
Na verdade, a estrutura social e cultural de cada época sinaliza os objetivos que tal cultura prioriza e os meios para atingi-los. Na nossa sociedade, o aparecimento do indivíduo da era do consumo massificado, hipervaloriza as imagens do novo e a rapidez. Assim, em prol de um futuro supostamente bem-sucedido, nossa cultura está colocando em risco aspectos importantes da formação humana.
Outra importante questão da atualidade é a patologização excessiva de comportamentos que antes eram considerados normais. Agitação e tristeza, por exemplo, sempre existiram, mas hoje são diagnosticadas como déficit de atenção/hiperatividade e depressão. A maioria dessas doenças muitas vezes são sintomas de sofrimentos que aparecem devido a sofrimentos, muitas vezes gerados por problemas familiares.
Outra questão importante é o consumo, um dos principais excessos da nossa era. Como resistir aos apelos das crianças por brinquedos, suportando a colocação de que “todo mundo tem”, evitando entrar nessa tendência de um consumismo desmedido? Esses objetos do desejo são múltiplos e mudam com a velocidade da luz. As crianças devem aprender a se contentar com o que tem e a não querer comprar o que o amiguinho acabou de ganhar, aguentando a frustação. Aprender a curtir aquilo que têm, sem ficar se lamuriando pelo que não têm.
A felicidade não pode passar pelo ter! O importante é saber lidar bem com a falta, o que faz aparecer o desejo do crescer. No entanto, em nossa sociedade tudo é trocado pela roupa de marca, cursos, esportes, viagens, etc.
E esse consumismo excessivo acaba desumanizando nossos filhos. Sabemos que o vínculo, o afeto, e os laços amorosos não vêm junto com os objetos de consumo. Nossos filhos definitivamente não se sentem amados por receber numerosos presentes. Contrariamente, uma criança com limites se sente mais segura.
Em um mundo em constante mudança, com crises econômicas em quase todo planeta, guerras e muita insegurança, leva muitas vezes o ser humano a se sentir deprimido, em pânico. Dentro desse quadro, em cada família se reproduz o cenário do estresse: salários baixos, possibilidade de demissão, violência nas ruas, trânsito caótico, entre muitas outras questões que levam os adultos ao limite; e isso “cai na cabeça dos filhos”. Por outro lado, hoje a tristeza vira depressão e é medicada com as novas “pílulas da felicidade”. Em resumo, tudo leva ao abandono da educação familiar e ao uso exagerado de “brinquedos e eletrônicos da felicidade”.
Outro excesso de nossa era é o tecnológico. Famílias inteiras passam o almoço de domingo olhando para o celular, deixando de dialogar entre si. O abuso de eletrônicos leva a uma imensa capacidade visual e motora e a uma escassíssima atividade simbólica e criativa, e à falta de interesse pelas questões humanísticas.
Brincar é o melhor exemplo de atividade simbólica em que a fantasia e a criatividade infantil inventam personagens e histórias que permitem às crianças entender seu mundo e seus problemas. A falta de diálogo e de trocas afetivas no âmbito da família são outros complicadores desse abuso absurdo dos eletrônicos. Muitas vezes a TV, o computador e o celular são muralhas que deixam os pais ausentes quando estão em casa. E pais ausentes, quando estão presentes, são piores do que pais ausentes de fato.
Devemos educar sem desvios, sem opressão e com uma conduta educativa ética. As crianças merecem respeito e pais atentos! Elas mostram que têm valores, sabem pensar e são inteligentes.
Regina Delduque, pedagoga formada pela USP, Diretora e Orientadora Educacional de escola de Educação Infantil há 47 anos. Especializada em Terapia Familiar, faço atendimento para Orientação de pais e mães. Pós graduada em Habilidades Socioemocionais e Autoconhecimento. Contato através do e mail: reginadelduque22@hotmail.com